A importância do MREL para a sustentabilidade do setor financeiro

8 out 2024

Por António Valente
Diretor Central da Direção de Contabilidade, Consolidação e Informação Financeira

Na sequência das lições aprendidas, sobretudo com a crise financeira de 2007, a regulamentação da atividade bancária tem evoluído com o objetivo de assegurar que eventuais resoluções bancárias não afetam a continuidade das funções económicas críticas, como o financiamento das empresas e das famílias e não têm quaisquer ónus para os Estados e, indiretamente, para os contribuintes.

Para cumprir esse objetivo e em complemento dos rácios de capital, foi criado um instrumento constituído pelo requisito mínimo de fundos próprios e de dívida elegível para bail-in (MREL - Minimum Requirement on Own Funds and Eligible Liabilities), a deter pelas instituições com importância sistémica, como a Caixa Geral de Depósitos.

O nível mínimo de MREL estabelecido pelo supervisor para cada banco deve permitir, em caso de resolução, capitais e passivos elegíveis para cobrir as perdas potenciais (LAA), para recapitalizar o banco após a absorção dessas perdas (RCA) e para garantir uma margem de capital que constitua uma reserva de confiança de mercado (MCC).

Os bancos têm vindo a adotar várias estratégias para cumprir os requisitos de MREL, destacando-se:

A redução de ativos de maior risco e por isso mais geradores de requisitos MREL, como a ativos não produtivos
A emissão de dívida elegível para bail-in, que são instrumentos de dívida que podem ser convertidos em capital para absorver perdas e para refinanciar o banco que resultar de um evento de resolução
O reforço dos fundos próprios através de aumentos de capital ou da geração orgânica por via da retenção de lucros

É inquestionável que o MREL tem contribuído para a estabilidade financeira das economias.

Ao obrigar o reforço dos níveis de capital dos bancos para financiar os requisitos de MREL, induz mais confiança dos investidores e depositantes. Os itens elegíveis para MREL formam uma barreira de proteção dos depósitos, dado que são esses os primeiros elementos utilizados para cobrir eventuais perdas e para refinanciar os bancos.

A forma de cálculo do MREL também induz o reforço da liquidez dos bancos porque há um forte incentivo para que estes apliquem a liquidez associada a parte dos seus passivos e capitais em ativos líquidos e sem risco.

O aumento da resiliência dos bancos por via da constituição de itens elegíveis para MREL reduz os efeitos sistémicos de uma resolução bancária, já que a gestão da crise é autónoma e fica contida na entidade resolvida. Tem também como consequência uma redução da dependência de fundos públicos para ultrapassar crises financeiras.

Contudo, é necessário ter presente que o cumprimento dos requisitos de MREL implica um conjunto de desafios e riscos, como:

Acesso limitado ao mercado para a emissão de dívida elegível, especialmente em períodos de instabilidade financeira
Custos de financiamento elevados com a emissão de nova dívida, afetando a rendibilidade dos bancos e sua capacidade de crescimento
Aumento de custos de estrutura associados à manutenção de processos e reportes complexos, determinados pelos reguladores
Risco reputacional pelo incumprimento dos requisitos de MREL

Em termos globais é fundamental que os vários requisitos prudenciais em vigor na União Bancária sejam devidamente calibrados, porque o excesso pode levar a uma maior restrição no financiamento da economia, não só porque os bancos terão de ter mais capital e dívida por cada unidade de crédito concedido, como também pelo aumento do custo de financiamento dos bancos e, consequentemente, dos clientes.

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