Daniel Rodrigues

Um Presidente entre duas ditaduras

Daniel Rodrigues, o Presidente que viu a sua administração duas vezes interrompida pelo poder totalitário das ditaduras.

A aposentação de José Estêvão de Vasconcelos e após uma curta administração interina de Raul Carmo e Cunha, abre as portas da Administração da Caixa a outro republicano convicto, a partir de outubro de 1917.

Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, Daniel José Rodrigues, usando também o nome de Daniel Rodrigues Salgado, nasceu em Britelo, concelho de Celorico de Basto em 1877. Desempenhou diversos cargos na área do Direito, tendo sido membro da Intendência dos Bens Inimigos, da Comissão Central de Execução da Lei de Separação da Igreja do estado, da Comissão Central de Revisão de Crédito Agrícola Mútuo, entre outros.

No domínio político, além de percorrer os corredores do parlamento como Presidente da Câmara dos Deputados, exerceu os cargos de Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Lisboa, Governador Civil de Lisboa e Ministro das Finanças.

As suas convicções políticas e filiação partidária deixaram marcas no seu percurso como Presidente da Caixa. Efetivamente poucos meses após a sua nomeação como Administrador, em fevereiro de 1918, Daniel Rodrigues foi exonerado do cargo, em consequência das alterações da conjuntura política ocorridas e a ascensão de Sidónio Pais ao Poder. Este afastamento duraria cerca de um ano, uma vez que por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de março de 1919 Daniel Rodrigues seria reinvestido nas funções de Administrador Geral.

É neste período de ausência e durante a presidência interina de Eurico Cameira, que se inicia a aplicação da primeira grande reforma da Caixa, publicada pelo Decreto nº 4.670 de 17 de julho de 1918. De grandes repercussões futuras na vida da Caixa, esta reforma incidiria particularmente nas áreas administrativa, gestão de pessoal, operações bancárias (operações cambiais e Casa de Crédito Popular).
A sua ação, após a reintegração na Presidência da Caixa, seria fundamental para levar a cabo as tarefas inerentes à implementação das transformações.

É com Daniel Rodrigues, em março de 1925, e após intensas diligências, nas quais se conta uma visita de trabalho ao Brasil, que a gestão da Agência Financial de Portugal no Rio de Janeiro transita para a Administração da CGD. Um profundo relatório sobre a situação da Agência e as necessidades logísticas e instalações testemunha o conhecimento e o seu envolvimento neste processo.

A conjuntura política, em Portugal, alterar-se-ia, a partir de 1926 e a ação de Daniel Rodrigues na administração da Caixa ficaria novamente condicionada. É manifesta a diferença de pontos de vista expressa na troca de correspondência entre o próprio e o Ministro das Finanças, Oliveira Salazar, acerca da preparação da legislação que iria regulamentar a futura reforma de 1929.

Significativo deste clima de tensão é igualmente o facto da implementação da referida reforma se dar quando Daniel Rodrigues se encontra, mais uma vez detido sem culpa formada entre 20 de abril e 16 de maio de 1929. Por outro lado, aquando do seu regresso à Administração da Caixa constatou que para os 3 dos lugares de vogais, previstos na nova lei orgânica haviam já sido empossados personalidades da confiança de Salazar.
Estava, desta forma, aberto a caminho a algumas contendas internas, particularmente nas linhas de orientação que a Caixa deveria prosseguir, no futuro, nos domínios económico e financeiro. Se para Daniel Rodrigues a Caixa prestava um “serviço público” e era uma “escola de economia individual e um órgão de assistência”, (em 1924 são lançados os primeiros depósitos de poupança), para os novos administradores e Salazar, aquela deveria constituir um auxiliar de equilíbrio das finanças públicas e um instrumento da sua política económica e social.

O antagonismo de posições foram-se extremando e as propostas de Daniel Rodrigues ao Conselho eram frequentemente reprovadas pela maioria dos seus pares. A 6 de outubro de 1931 terminava a sua comissão de serviço. Num tom muito formal enviou ao Conselho de Administração uma carta de apresentação de cumprimentos de despedida, a qual seria lida na sessão do dia seguinte. Terminava, assim, o mandato de um dos administradores, que pela primeira vez ousou afrontar duas tendências do poder político – o Sidonismo e o Salazarismo.

Zacarias Dias
Gabinete do Património Histórico da CGD
Setembro de 2010

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