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Mais do que simples estabelecimentos comerciais, as lojas com história são verdadeiras guardiãs da memória coletiva, da identidade das cidades e da autenticidade dos bairros. Reconhecê-las e protegê-las não é apenas um gesto simbólico, mas sim um investimento no património cultural e no tecido económico local.
Quer saber como identificar estas lojas e por que motivo vale a pena valorizá-las? Conheça os critérios que as distinguem e os benefícios associados ao seu reconhecimento.
O que são as lojas com história?
São estabelecimentos comerciais com especial valor histórico, cuja preservação importa salvaguardar por razões culturais, sociais ou económicas. Este reconhecimento está previsto na Lei n.º 42/2017, que define o enquadramento legal para proteger e promover estes espaços emblemáticos.
Na maioria dos casos, são negócios com atividade relevante e contínua há pelo menos 25 anos. Distinguem-se pela sua antiguidade, decoração original, singularidade arquitetónica ou pela manutenção de ofícios e tradições comerciais que fazem parte da identidade local.
Exemplos típicos incluem cafés, retrosarias, alfarrabistas, livrarias, barbearias ou restaurantes, entre outros. A Lei abrange também entidades de interesse histórico e cultural ou social, como coletividades ou associações culturais que sejam uma referência na vida local, mesmo sem fins lucrativos.
Valorização local com expressão nacional
O reconhecimento das lojas com história é uma responsabilidade dos municípios, que têm vindo a implementar projetos próprios para valorizar o comércio tradicional com relevância histórica, cultural ou social. Lisboa foi pioneira com o projeto Lojas com História, lançado em 2015. Hoje, iniciativas semelhantes existem um pouco por todo o País, como o programa Porto de Tradição, na cidade do Porto, Lojas com História do Funchal ou as Lojas e Oficinas com História, em Braga.
Tome Nota:
Antes de submeter uma candidatura, é importante verificar se o município tem um regulamento próprio para o reconhecimento de lojas com história. Esse regulamento pode definir condições adicionais, como número mínimo de anos de atividade, elementos patrimoniais valorizados ou documentação obrigatória.
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Quais os critérios para ser considerada uma loja com história?
A legislação define os critérios para reconhecer lojas ou entidades como tendo interesse histórico, cultural ou social local. Esta lei atribui também aos municípios um papel central neste processo.
Compete a cada município:
- Identificar e reconhecer lojas ou entidades com interesse histórico;
- Comunicar ao Estado, através da Direção‑Geral das Atividades Económicas, a listagem dessas entidades, para integração no Inventário Nacional Comércio com História.
Quais são os critérios gerais de reconhecimento?
Para que um estabelecimento possa ser reconhecido, consideram-se três critérios principais:
- Atividade desenvolvida (continuidade, relevância, impacte local);
- Património material (como edifícios, mobiliário, decoração original);
- Património imaterial (tradições, práticas ou ofícios ligados à identidade local).
A forma como estes critérios devem ser avaliados está descrita no artigo 4.º e no n.º 4 do artigo 6.º da Lei n.º 42/2017.
O que é o Comércio com História?
O Comércio com História é um inventário nacional que reconhece e valoriza estabelecimentos de interesse histórico, cultural ou social local. Procura preservar o comércio tradicional e proteger lojas que fazem parte da identidade das cidades. Atualmente, o inventário inclui mais de 450 estabelecimentos organizados por áreas de atividade em todo o País. Estes espaços distinguem-se pelo seu legado, autenticidade e contributo para a memória coletiva.
Os municípios podem definir critérios próprios?
Sim. Cada município pode:
- Aplicar apenas os critérios gerais da Lei n.º 42/2017;
- Ou ir mais longe, criando critérios especiais adaptados à realidade local (por exemplo, exigir um número mínimo de anos de atividade ou valorizar determinados elementos do património).
Nestes casos, a câmara municipal deve aprovar um regulamento específico, sujeito a:
- Discussão e aprovação na Assembleia Municipal;
- Parecer da Direção-Geral do Património Cultural, a emitir no prazo máximo de 60 dias.
Como aceder ao estatuto de loja com história?
O reconhecimento de uma loja ou entidade como tendo interesse histórico, cultural ou social local é da responsabilidade do município onde se encontra. O processo decorre no âmbito do projeto Comércio com História.
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Quem pode iniciar o processo?
O reconhecimento pode ser por iniciativa do próprio município ou pedido pelo titular da loja ou entidade, junta de freguesia da área onde está localizada ou por uma associação de defesa do património cultural.
Tipologias de lojas com história
O inventário nacional do projeto Comércio com História abrange uma grande diversidade de lojas que marcam o tecido urbano e a identidade local de várias localidades portuguesas. Eis as principais tipologias:
- Restauração e hotelaria;
- Lar, decoração e bricolage;
- Comércio alimentar tradicional;
- Cultura e lazer;
- Saúde, beleza e bem-estar;
- Vestuário e acessórios;
- Artes e ofícios;
- Livrarias, tabacarias, papelarias e brinquedos;
- Ourivesarias e relojoarias;
- Serviços e reparações;
- Floristas e produtos agrícolas;
- Desporto.
Onde e como apresentar a candidatura?
Cada município pode aplicar os critérios gerais definidos pela Lei ou adotar um regulamento municipal próprio, com regras adaptadas à sua realidade local.
As condições específicas para apresentação de candidaturas, como formulários, prazos, documentos necessários, entre outras informações, são publicados no site oficial de cada município.
A candidatura é, por norma, submetida através do site do município ou diretamente nos balcões de atendimento.
Depois, os municípios analisam a história do estabelecimento, a sua importância cultural e a manutenção de elementos originais. Se aprovada, a loja recebe o título oficial de Loja com História.
O que acontece após o reconhecimento?
Quando um estabelecimento é reconhecido, pode ser incluído no Inventário Nacional Comércio com História.
A partir daí, pode aceder a:
- Benefícios fiscais ou isenções atribuídas pelos municípios;
- Medidas de proteção e valorização do património;
- Maior visibilidade pública, enquanto parte da identidade cultural local.
Tome Nota:
O pedido de reconhecimento não é feito através do site nacional do Comércio com História, mas junto do município onde a loja está sediada.
Quais os benefícios para os proprietários?
Ser reconhecido como uma Loja com História pode trazer diversas vantagens, tanto a nível económico como institucional. Estes benefícios variam consoante o município, mas geralmente incluem:
- Isenções fiscais, como a redução do IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) quando previstas nos regulamentos municipais;
- Acesso a linhas de financiamento específicas para obras de recuperação ou modernização que respeitem o caráter histórico do espaço;
- Apoio técnico e jurídico por parte das autarquias, nomeadamente em processos de licenciamento ou obras;
- Divulgação em plataformas institucionais, aumentando a visibilidade do negócio;
- Proteção contra demolições ou alterações que prejudiquem o seu carácter original.
Estes apoios podem ajudar os proprietários a enfrentar desafios como a concorrência de grandes superfícies e os custos elevados de manutenção de espaços antigos.
Tome Nota:
A Lei n.º 1/2023 prolonga a proteção dos arrendatários de lojas com história até 31 de dezembro de 2027. Até lá, estes estabelecimentos não podem ser submetidos ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) nem ver salvo acordo entre inquilino e senhorio.
E para os clientes?
Os clientes também beneficiam da existência de lojas com história. Estes espaços oferecem uma experiência única de consumo, diferente da padronização das grandes cadeias. São locais onde se respira nostalgia, onde se encontram produtos raros ou feitos à mão e onde o atendimento é muitas vezes personalizado.
Além disso, ao comprar numa loja com história, está a apoiar o comércio local e a contribuir para a preservação do património cultural da cidade. É também uma forma acessível de turismo cultural, que começa com uma simples visita ao café, barbearia ou retrosaria do bairro.
Exemplos emblemáticos de lojas com história em Portugal
Por todo o País há estabelecimentos que preservam a identidade local e contam estórias e História através do espaço, dos produtos e das pessoas. Alguns exemplos que vale a pena conhecer:
- Café Astória (Braga) – Inaugurado em 1928 na icónica Arcada, foi ponto de encontro de figuras da política, da literatura e das artes, conhecido pela decoração elegante e ambiente requintado;
- Mercadora (Funchal) – Mercearia tradicional junto ao Mercado dos Lavradores, ativa desde 1966, famosa pelas especiarias, mistura secreta de condimentos e uma taberna onde se serve poncha;
- Ourivesaria Costa (Coimbra) – Fundada em 1936, é a ourivesaria mais antiga da cidade, com forte ligação à Universidade de Coimbra e conhecida pelos seus anéis de curso;
- Majestic Café (Porto) – Um ícone da Belle Époque, aberto em 1921 na Rua de Santa Catarina. Frequentado por intelectuais, artistas e até por Gago Coutinho, é hoje símbolo do charme portuense;
- Luvaria Ulisses (Lisboa) – Aberta em 1925, no Chiado, é um dos espaços comerciais mais pequenos da capital, especializado em luvas feitas à medida, com um ritual de atendimento que resiste ao tempo.
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A informação deste artigo não constitui qualquer recomendação, nem dispensa a consulta necessária de entidades oficiais e legais.