mudar a lei nacional

Iniciativa legislativa: sabe que pode ajudar a fazer uma lei?

Leis e Impostos

Os cidadãos podem, através de iniciativas legislativas, ajudar a mudar a lei nacional. Saiba como exercer este direito. 23-09-2022

Tempo estimado de leitura: 7 minutos

As leis são feitas para os cidadãos, mas também podem ser feitas pelos cidadãos, através de iniciativas legislativas. Embora esta forma de participação cívica não seja do conhecimento da generalidade das pessoas, está prevista na Constituição da República. Por isso, é um direito consagrado por lei.

A participação em processos de criação ou alteração de leis é, além de um direito, um dever de qualquer cidadão. Reparar injustiças e falhas na legislação ou contribuir para um país melhor está, afinal, ao seu alcance. Veja como.

Cidadãos ajudam a mudar lei: um exemplo

A Lei 1/2022 que alargou o período de luto parental para 20 dias consecutivos e concedeu a possibilidade de acompanhamento psicológico por perda de um familiar próximo é um exemplo de como a lei pode mudar por iniciativa dos cidadãos.

A petição da Associação Acreditar sobre o tema do luto parental despertou a atenção dos partidos e levou a que apresentassem vários projetos de lei que acabaram por dar origem a alterações à legislação até então em vigor.

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O que é a iniciativa legislativa?

O direito de iniciativa legislativa permite que um grupo de cidadãos eleitores possa apresentar projetos de lei à Assembleia da República (AR) e participar no respetivo procedimento legislativo.

Os projetos de lei apresentados por cidadãos devem ter sido subscritos por, pelo menos, 20 mil eleitores.

A iniciativa legislativa pode também partir dos deputados ou grupos parlamentares, assumindo igualmente a designação de projeto-lei. Se partir do Governo ou das Assembleias Legislativas Regionais chama-se proposta de lei.

O que diz a lei?

O direito de iniciativa legislativa dos cidadãos está consagrado no artigo 167.º n.º 1 da Constituição. A regulamentação e procedimentos relativos a uma iniciativa legislativa de cidadãos são definidos pela Lei n.º 17/2003.

Ao abrigo da Constituição (Artigo 115.º) prevê-se ainda que a iniciativa dos cidadãos possa igualmente originar a convocação de um referendo. Os referendos só podem ter por objeto “questões de relevante interesse nacional que devam ser decididas pela Assembleia da República ou pelo Governo”.

 

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Como apresentar uma iniciativa legislativa?

As iniciativas legislativas podem ser submetidas em papel ou por via eletrónica, através do site do Parlamento.

Ao apresentar a iniciativa legislativa, é necessário constituir uma comissão representativa, que deve ter entre um mínimo de 5 e um máximo de 10 elementos. Este grupo representa os subscritores da proposta e vai ser notificado de todos os atos que digam respeito à iniciativa e respetivo processo legislativo.

A iniciativa legislativa (ou projeto de lei) é escrita sob a forma de artigos. Deve descrever de forma sintética o objeto principal, justificando os motivos sociais, económicos, financeiros e políticos que levaram à sua submissão. Deve também mencionar quais as leis a alterar, ou com ela relacionadas, assim como as principais consequências da sua aplicação.

Tome Nota:

No site do Parlamento encontra iniciativas legislativas que pode subscrever e que podem ajudar a perceber a estrutura deste tipo de documento.

Tem de conter ainda a identificação de todos os proponentes (nome completo, número do bilhete de identidade ou do cartão de cidadão e data de nascimento), a identificação dos elementos da comissão representativa e uma lista dos documentos anexados.

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Como decorre o processo de apreciação e votação?

Após a submissão, o documento é analisado pelos serviços da AR, que verificam se cumpre os requisitos necessários, nomeadamente no que respeita às assinaturas.

Se a iniciativa for admitida, o presidente da Assembleia da República ordena que seja publicada no Diário da Assembleia da República, remetendo-a a uma comissão especializada para que, no prazo de 30 dias, possa elaborar o respetivo relatório e parecer.

Caso o tema da iniciativa seja considerado como especialmente relevante, a comissão pode propor ao presidente da Assembleia da República a sua discussão pública. Após ter recebido o parecer positivo da comissão, o presidente da Assembleia da República deve agendar a apreciação e votação na generalidade para uma das 10 reuniões plenárias seguintes, notificando a comissão representativa.

A iniciativa é então discutida na AR e, caso seja aprovada na generalidade, é enviada para a comissão competente para que seja apreciada e votada na especialidade. Esta comissão tem poder para apresentar textos de substituição ou seja, propor alterações à proposta inicial.

O que são as comissões parlamentares?

São órgãos do Parlamento, constituídos por deputados, que têm como funções a produção legislativa, a fiscalização da atividade do Governo, o contato com a sociedade civil e representação da Assembleia da República. Existem comissões permanentes e especializadas, em áreas como Saúde, Justiça, Defesa, Orçamento, Educação, Assuntos Europeus. A AR tem ainda comissões eventuais, que são criadas por um período limitado de tempo e um determinado objetivo. É o caso das comissões de inquérito, por exemplo.

Após a apreciação e eventual alteração, procede-se à votação na especialidade no prazo máximo de 30 dias. Depois, há um prazo máximo de 15 dias para a votação final global.

Tome Nota:

A votação na generalidade diz respeito às linhas gerais da iniciativa. A votação na especialidade isto é, artigo por artigo, pode ser feita no Plenário ou em Comissão. As questões referentes a eleições, referendo, partidos políticos e criação ou modificação territorial das autarquias têm obrigatoriamente de ser votadas em Plenário.

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Que cidadãos podem submeter uma iniciativa legislativa?

Podem ser autores de iniciativas legislativas os cidadãos inscritos no recenseamento eleitoral, quer em território nacional, quer no estrangeiro. 

O exercício deste direito é gratuito e as entidades públicas ou privadas não podem cobrar taxas ou impostos, nem impedir ou dificultar os atos necessários a estas iniciativas, como é o caso da recolha de assinaturas.

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O que pode ser alvo de iniciativa legislativa dos cidadãos?

As iniciativas legislativas dos cidadãos podem abranger todas as matérias sobre as quais a Assembleia da República possa legislar (ver Artigos 164º e 165º da Constituição), exceto alterações à Constituição ou assuntos cuja iniciativa pertença exclusivamente ao Governo, como matéria respeitante à sua organização e funcionamento (Artigo 198º da Constituição da República Portuguesa), ou às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas (conforme Artigo 227º).

As amnistias e perdões genéricos, assim como matérias de natureza ou conteúdo orçamental, tributário ou financeiro também não podem ser objeto destas iniciativas.

Os cidadãos também não podem apresentar iniciativas que violem a Constituição ou os princípios nela consignados ou que não definam, de forma concreta, as alterações legislativas propostas. O mesmo se passa em relação a projetos de lei que envolvam um aumento das despesas ou diminuição das receitas previstas no Orçamento do Estado em vigor.

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