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As dívidas não desaparecem com a morte. Além da dor da perda, o falecimento pode tornar-se uma dor de cabeça para os mais próximos, que acabam também por herdar as dívidas do falecido.
Existem, no entanto, mecanismos legais que protegem quem herda, garantindo que não tenha de responder com os seus próprios bens para pagar as dívidas.
Se receber uma herança, saiba o que fazer para se acautelar.
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O Código Civil (Artigo 2068.º) é bastante claro quanto à ordem pela qual os encargos da herança, onde se incluem as dívidas, devem ser satisfeitos.
Em primeiro lugar devem ser pagas as despesas com o funeral, seguindo-se os gastos com a administração da herança, por exemplo, os que estão relacionados com a habilitação de herdeiros e outras despesas. Seguem-se as dívidas do falecido e só depois o cumprimento dos legados, ou seja, a entrega dos bens aos herdeiros.
Isto significa que, antes de estes tomarem posse dos bens, a herança tem de servir para pagar o funeral, as burocracias e as dívidas que possam existir.
Se os próprios herdeiros tiverem dívidas, estas terão de esperar, já que os credores do falecido têm prioridade sobre os dos herdeiros.
Tome Nota:
No caso de haver dívidas ao falecido, o cabeça-de-casal pode fazer essa cobrança caso entenda que a demora pode pôr em causa o seu pagamento ou se o devedor decidir pagar de forma espontânea.
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Que dívidas pode herdar?
Podem ser herdados dívidas, hipotecas, penhores e impostos, o que significa que se o falecido mantém alguma destas situações pendente, caberá aos herdeiros resolvê-la.
As dívidas ao Estado são um desses casos. De acordo com a lei (artigo 29.º da Lei Geral Tributária), as obrigações tributárias são transmissíveis por herança, mesmo que não tenham sido ainda liquidadas. Ou seja, se o falecido deixou impostos por pagar, terão de ser os seus herdeiros a saldá-los.
Além das dívidas, o óbito também não extingue as obrigações declarativas, pelo que no ano que se segue à morte é necessário apresentar a declaração de IRS do falecido.
Se estiver a decorrer um processo de execução fiscal, a cabeça de casal fica responsável por tomar as decisões relacionadas com o pagamento da dívida. Caso já tenham sido feitas as partilhas, o órgão da execução fiscal vai notificar os herdeiros, para que cada um pague a parte da dívida que corresponde à sua quota da herança.
Já as coimas por infrações tributárias extinguem-se com a morte do infrator.
Quem é o cabeça de casal?
O cabeça de casal é a pessoa que fica responsável pela administração da herança até que sejam feitas as partilhas. Geralmente é o cônjuge ou um filho mas, existindo acordo entre os herdeiros, pode ser escolhida outra pessoa.
Tome Nota:
Os herdeiros podem averiguar, junto da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) a existência de um seguro de vida do falecido.
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E se o valor da dívida for superior ao da herança?
A responsabilidade pelos encargos da herança está limitada aos bens herdados, o que significa que as dívidas só têm de ser pagas na medida dos bens deixados.
Apesar de poder herdar dívidas, o herdeiro pode não ter de recorrer ao património próprio para as pagar. Cabe-lhe, no entanto, provar que os bens que receberam não são suficientes para as saldar. Caso contrário, terá mesmo de usar os seus próprios bens e recursos.
Por isso, se suspeitar que uma herança é deficitária, isto é, que valor das dívidas é superior ao da herança, tem duas opções: repudiá-la (como explicaremos no ponto a seguir) ou aceitá-la a benefício de inventário. Neste último caso, só responde pelas dívidas de bens que constem do inventário.
Tome Nota:
Para fazer a aceitação a benefício de inventário tem de requerer um inventário. Nesta página encontra os 8 passos a seguir para fazer o requerimento.
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É possível recusar uma herança?
Os herdeiros têm sempre a possibilidade de repudiar uma herança, mas há vários pontos que deve ter em conta antes de tomar esta decisão.
O primeiro é que o repúdio da herança tem de abranger a totalidade do que herdou (bens e dívidas), não sendo possível repudiar apenas parte da herança. O direito de aceitar ou repudiar os bens pode ser exercido até 10 anos depois de ter conhecimento de que é beneficiário da herança.
Esta decisão é irrevogável, o que significa que não pode arrepender-se e decidir, mais tarde, aceitar a herança que repudiou ou repudiar o que já aceitou.
Outro ponto a ter em conta é que só pode repudiar uma herança que não tenha sido tacitamente aceite. Por exemplo, se usar uma casa ou uma viatura do falecido, estará a aceitar essa herança.
O repúdio da herança deve ser feito por escrito, num Cartório Notarial, entregando depois esse documento autenticado nas Finanças e na Conservatória do Registo Predial, caso existam imóveis.
Se for casado em regime de comunhão de bens, deve ter autorização do cônjuge para repudiar a herança. Sempre que existe repúdio, essa parte da herança passará a estar disponível para os seus descendentes. E, caso estes sejam menores e também não queiram aceitar, terão de ser autorizados pelo Ministério Público a recusar os bens.
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