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O testamento firma a vontade de uma pessoa sobre como devem ser distribuídos os seus bens quando morrer. Fazer um testamento é um passo fundamental para fazer respeitar esta vontade.
Consegue ainda evitar conflitos familiares que muitas vezes ocorrem nas partilhas, mas para ser válido tem de cumprir alguns requisitos. Saiba quais são.
O que saber antes de redigir um testamento
Quando não existe testamento, a herança é distribuída pelos herdeiros legítimos, tendo em conta a seguinte ordem:
- Cônjuge (marido ou mulher) e descendentes (filhos ou netos da pessoa falecida, caso já não tenha filhos);
- Cônjuge e ascendentes (pais ou avós da pessoa falecida, se já não tiver pais);
- Irmãos e seus descendentes;
- Outros parentes até ao quarto grau (primos direitos, tios-avós e sobrinhos-netos);
- Estado.
Se pretender beneficiar outras pessoas, que não os herdeiros legítimos, é necessário deixar essa vontade escrita em testamento.
Mas atenção, a Lei reserva sempre uma quota legítima que não pode ser objeto de testamento. E por isso, deve ser sempre entregue aos herdeiros legitimários.
Mesmo em caso de testamento, uma parte da herança - aquota legítima - tem de ser obrigatoriamente atribuída aos herdeiros legitimários. Isto é, ao cônjuge, descendentes e ascendentes.
Estes herdeiros ficam assim sempre salvaguardados. A parte que lhes cabe na herança não pode ser doada ou deixada em testamento a outras pessoas.
Só a restante parcela - a quota disponível - pode ser transmitida através de testamento a quem bem entender, seja familiar ou não. Ou seja, é na gestão desta quota que podem surgir muitos dos conflitos de heranças. Daí a importância de fazer um testamento.
Por exemplo, alguém que viva em união de facto com o falecido pode apenas aceder à parte da herança identificada em testamento. Se não houver transmissão dos bens por testamento, nada terá a receber. O mesmo ocorre com as doações em vida.
Como funciona a quota legítima?
A quota legítima (ou quota indisponível) é a parte da herança de que o testador não pode dispor livremente e varia conforme os herdeiros legitimários. Por exemplo:
- Se o único herdeiro legitimário for o cônjuge: tem direito a 50% da herança. A quota disponível é a outra metade;
- Se tiver cônjuge e filhos: a quota legítima são dois terços da herança;
- Se não tiver cônjuge mas tiver filhos: a quota legítima é de metade ou dois terços da herança, conforme exista um filho ou dois ou mais;
- Sem descendentes, mas com um cônjuge e ascendentes: a quota legítima é de dois terços da herança.
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Quem pode fazer um testamento?
Pode tratar da sua herança quem é maior de idade. A outra condição para poder ser testador, ou seja, para poder fazer um testamento, é que não exista interdição por incapacidade psíquica. As pessoas invisuais ou analfabetas só podem ter um testamento público.
Um testamento pode não ser definitivo. Pode ser revogado, de forma expressa, tácita ou real:
- Se mudar de ideias, pode recorrer à revogação expressa, que pode ser feita através de novo testamento ou escritura pública em que declara expressamente que pretende revogar o anterior testamento;
- A revogação tácita pressupõe que existe um segundo testamento onde existe uma incompatibilidade com o primeiro. Nesse caso, o primeiro testamento é revogado (fica sem efeito) na parte em que é incompatível com o mais recente;
- A revogação real pode ocorrer em dois casos: por destruição física do documento (aplicável apenas aos testamentos cerrados) e por inexistência ou transformação da herança (por exemplo, um carro que é vendido antes do óbito).
Tome Nota:
A revogação de um testamento pode ser total se foram revogadas todas as disposições, ou parcial, se só parte delas forem revogadas.
Testamento público e testamento cerrado
Em Portugal, existem dois tipos de testamento:
- Público: quando é escrito no Cartório Notarial;
- Cerrado: se for escrito pela pessoa que deixa os bens ou por alguém a seu pedido, como um advogado. Depois de escrito e assinado, o testamento deve ser levado a um cartório notarial para ser aprovado. De outra forma não tem valor jurídico. Depois, o testamento pode ser guardado pelo seu autor, entregue a outra pessoa ou depositado numa repartição notarial (a da aprovação ou outra).
Tome Nota:
Caso faça um testamento cerrado e o entregue a alguém da sua confiança, essa pessoa deve, no prazo de três dias após ter conhecimento do óbito, apresentar o documento ao notário.
Quem pode e não pode herdar?
Animais de companhia não podem ser herdeiros. Já pessoas que fiquem encarregues de tomar conta deles podem ser beneficiárias de um testamento.
Mas existem mais interdições. Se a pessoa com quem o testador era casado tiver cometido adultério, não pode herdar. Também a pessoa que vivia em união de facto com o falecido (não é equiparado a cônjuge) fica impedida de ser beneficiária a menos que haja vontade expressa em testamento.
Um condenado ou cúmplice de homicídio, ainda que apenas na forma tentada, contra o autor da herança, seu cônjuge, ascendentes e descendentes também não pode herdar.
Médicos, enfermeiros e sacerdotes que prestaram assistência a alguém que esteve doente e faleceu em consequência dessa doença também não podem constar do seu testamento.
Já entidades coletivas (como instituições e o Estado) podem ser herdeiras.
A capacidade sucessória é igualmente válida para descendentes que podem ter sido concebidos, mas ainda não tiverem nascido aquando da morte do testador.
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Onde fazer um testamento?
Para fazer um testamento, basta fazer um agendamento num cartório notarial público ou privado. No caso dos públicos, pode fazê-lo através da Plataforma Siga.
Se morar no estrangeiro, pode fazer um testamento num consulado de Portugal do país onde reside.
Tome Nota:
Os cartórios notariais públicos de competência especializada de Aveiro, Matosinhos e Porto, assim como os Cartórios Notariais de Protesto de Letras de Lisboa e do Porto não prestam este serviço.
Quais os preços: documentos e testemunhas
Um testamento público ou a aprovação de um testamento cerrado, em cartório notarial público tem o custo de 159 euros. No primeiro caso, não é obrigatório recorrer a um advogado para redigir o testamento.
Mas se prevê conflitos ou se quer garantir que o documento cumpre todos os pressupostos legais, é aconselhável procurar um. O valor do testamento pode ser pago em dinheiro, multibanco, cheque ou vale postal.
No dia agendado, o testador deve fazer-se acompanhar de duas testemunhas. Se forem todos cidadãos portugueses ou oriundos de um dos países da União Europeia, incluindo a pessoa que deixa os bens, devem apresentar um documento de identificação (cartão de cidadão, documento equivalente, ou ainda a carta de condução desde que emitidos por um país da União Europeia).
As testemunhas nacionais mas que venham de fora de um país da União Europeia devem apresentar o passaporte.
Não são aceites como testemunhas:
- Beneficiários do testamento;
- Casados entre si;
- Menores não emancipados;
- Pessoas surdas, mudas ou cegas;
- Pessoas com incapacidade psíquica;
- Que não sabem ou não podem assinar;
- Que não entendem a língua portuguesa;
- Colaboradores do cartório;
- Cônjuge, pais, mães, filhos, filhas, irmãos, irmãs, cunhados e cunhadas da pessoa que está a fazer o testamento e do notário;
- Pessoas que prestem serviço de perícia, tradução, interpretação ou leitura do testamento.
Como saber se existe testamento?
Apenas pode saber-se da existência de um testamento depois da confirmação da morte do testador. Estando a pessoa viva, exige-se a sua autorização.
Em caso de óbito, é então necessário requerer a certidão sobre a existência de testamento, escritura de renúncia ou repúdio de herança ou legado. O pedido pode ser feito online através dos serviços do Instituto de Registos e Notariado.
Quem deve estar presente na leitura de um testamento?
No dia da leitura do testamento, feita em voz alta pelo notário, devem estar presentes o representante ou os interessados e as testemunhas. Depois de aberto, o testamento é rubricado em todas as folhas pelos presentes, sendo arquivado em seguida.
Herdeiros pagam imposto?
Antes de decidir a quem deixar os seus bens, saiba que os seus herdeiros podem ter de pagar imposto do selo sobre a herança. Embora exista isenção para os casados e os unidos de facto, descendentes e ascendentes, todos os outros pagam 10% de imposto.
Outro dado importante a salientar é que, apesar de estarem isentos do pagamento de impostos, os cônjuges, unidos de facto, ascendentes e descendentes têm de declarar os bens herdados às finanças.
Estão sujeitos a imposto do selo os seguintes bens:
- Móveis sujeitos a registo (automóveis, motos, barcos, armas);
- Outros bens móveis (ouro; obras de arte; ações);
- Imóveis rústicos e urbanos.
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A informação deste artigo não constitui qualquer recomendação, nem dispensa a consulta necessária de entidades oficiais e legais.