Tempo estimado de leitura: 7 minutos
Entre as medidas previstas no pacote Mais Habitação, em vigor desde 7 de outubro de 2023 com o objetivo de aumentar a oferta de imóveis e contribuir para a garantia à habitação, destaca-se o regime do arrendamento forçado de imóveis identificados como devolutos pelos municípios.
Saiba como funciona este processo e quais os cuidados a ter pelos proprietários.
Apartamentos devolutos: em que consiste o arrendamento forçado?
Apesar de todas as dúvidas que suscitou quanto à sua constitucionalidade, o regime do arrendamento forçado de imóveis, devolutos há mais de dois anos, entrou em vigor. Surge no âmbito das medidas do pacote Mais Habitação, lançado pelo Governo para fazer face à crise no setor da habitação.
Este novo regime do arrendamento forçado de imóveis devolutos atinge os que reúnam as seguintes características:
- Apartamentos destinados a habitação (não estão abrangidas moradias ou outro tipo de edificações);
- Considerados devolutos há mais de dois anos, pela câmara municipal;
- Localizados em zonas de elevada densidade populacional (fora das zonas do interior do país), em Portugal continental.
O setor da habitação em Portugal
De acordo com um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, em 2023:
- Uma pessoa a viver sozinha e a comprar casa nas freguesias mais baratas de Lisboa ou Porto, precisa de ter poupanças entre 20 e 30 mil euros e um rendimento enquadrado na classe dos 20% mais ricos dessas cidades;
- Portugal é o segundo país da OCDE com mais jovens adultos a viverem com os pais;
- Em 2020, o rendimento dos portugueses (PIB per capita) sofreu uma queda de 8%, enquanto o preço das casas aumentou 8%;
- Em média, as casas vendidas em Portugal custam 1 565 euros por m2;
- Em algumas freguesias do centro de Lisboa, mais de 50% das casas são para Alojamento Local (AL). Cerca de 90% dos espaços disponíveis até 2022 foram criados entre 2014 e 2019;
- Entre 2013 e 2022, foram construídas 150 mil novas casas em Portugal, quatro vezes menos do que na década anterior.
Leia também:
- Venda da casa: documentos e despesas?
- Hipoteca: o que é e como funciona
- Apoios face à subida do crédito habitação: como funcionam?
Que imóveis podem ser considerados devolutos?
De acordo com a Lei de Bases da Habitação, é considerado devoluto um imóvel que não esteja a ser usado para habitação de modo contínuo e durante mais de um ano sem motivo aparente.
Cabe aos municípios a identificação dos imóveis devolutos, tendo por base alguns indicadores, tais como:
- Inexistência de contratos de serviços, como telecomunicações, água, gás e eletricidade, ou consumos anormalmente baixos de água e eletricidade durante períodos prolongados. As empresas de fornecimento destes serviços são obrigadas a comunicar os consumos aos municípios. Anualmente, até 1 de outubro, enviam uma lista dos imóveis que não possuem contratos de fornecimento ou que registem consumos anormalmente baixos.
- Desocupação do imóvel, confirmada por uma vistoria.
Tome Nota:
São considerados anormalmente baixos os consumos de 7 metros cúbicos por ano no caso da água e de 35 kWh por ano na eletricidade
Excluem-se da classificação de devolutas habitações com as seguintes características:
- Destinadas a férias e segundas habitações, quer para uso próprio ou para arrendamento temporário;
- Pertencentes a emigrantes ou a pessoas que ausentes da sua habitação por motivos de saúde, profissionais ou formativos;
- Proprietários residem num equipamento social, como um lar, por exemplo, ou estejam ausentes por prestar cuidados permanentes, como cuidadores informais;
- Que estejam a ser alvo de obras de reabilitação, desde que certificadas pelos municípios;
- Com conclusão de construção ou emissão de licença de utilização ocorrida há menos de um ano;
- Adquiridas para revenda por pessoas singulares ou coletivas, e que tenham beneficiado ou venham a beneficiar da isenção de 3 anos do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMT);
- Que serviam de residência nacional a emigrante português ou a cidadão português a desempenhar funções (ou comissões) de carácter público ao serviço do Estado Português no estrangeiro em organizações internacionais, ou em funções de reconhecido interesse público, assim como aos seus respetivos acompanhantes autorizados.
Leia também:
- As regras das despesas com obras: impostos e benefícios fiscais
- Porta 65: 10 perguntas e respostas para perceber este apoio
- Tem um alojamento local? Saiba o que muda
O que diz a lei
O Programa Mais Habitação, onde se insere o regime do arrendamento forçado, entrou em vigor com a publicação da Lei n.º 56/2023. Prevê uma série de medidas de apoio ao setor da habitação, de onde se destacam o apoio às rendas, a bonificação temporária de juros no crédito habitação e medidas de alívio das taxas de juro, entre outras.
Como funciona o arrendamento forçado?
Se a câmara municipal considerar que o imóvel está devoluto há dois anos, deve notificar o seu proprietário sobre o dever de o manter em bom estado, realizando as obras de conservação necessárias, ou a dar uso ao imóvel.
Simultaneamente, o município pode apresentar ao proprietário uma proposta de arrendamento. O valor de renda proposto não pode exceder 30% dos valores máximos de renda em vigor para cada tipo de imóvel, em cada município, no âmbito do Programa de Apoio ao Arrendamento.
Caso o proprietário não se pronuncie no prazo de 90 dias, ou recusar a proposta, e o imóvel se mantiver devoluto, o município pode avançar com obras de conservação e com o seu arrendamento forçado. De acordo com a Lei, isto ocorre apenas se revelar “necessário para garantir a função social da habitação” e de forma “excecional e supletiva”. O valor das rendas servirá, posteriormente, para o pagamento das obras.
Se o município não tiver intenção de proceder ao arrendamento forçado do imóvel que não deve apresentar necessidade de obras de conservação, a câmara remete toda a informação disponível sobre o imóvel ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), para que seja esta entidade a avaliar a opção de arrendamento forçado. Ainda assim, o município pode continuar a aplicar a esse imóvel taxas agravadas de IMI.
O QUE A CAIXA PODE FAZER POR SI?
Se a sua intenção é aproveitar um espaço que ainda não rentabiliza em pleno, pode ter necessidade de fazer obras e assumir com isso algumas despesas. Avalie possibilidades no mercado e decida em função dos objetivos desse projeto
Saiba Mais Aqui
Tome Nota:
Pode saber mais sobre as taxas agravadas dos prédios devolutos no artigo 112.º do Código do IMI
Dever de utilização
Além do novo regime do arrendamento forçado, foi acrescentado um novo artigo ao Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) que define o “dever de utilização” dos imóveis para habitação com o objetivo de reduzir o número de devolutos. São definidas fiscalizações periódicas pelas câmaras municipais, no sentido de avaliar as condições de habitabilidade. Caso sejam detetadas irregularidades, o município deve intimar o proprietário para a resolução destas inconformidades.
Leia também:
- As novas regras no IMI e no IMT: saiba o que muda
- Quais as despesas fiscais associadas à sua casa?
- Alojamento local: quais as obrigações fiscais
- Cuidador informal não principal: o que é e quais os direitos?
- Falha de eletricidade pode causar avarias. Saiba como reclamar
- Tem direito ao atestado multiuso?