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Pedir a insolvência pessoal pode ser a última opção para quem está em situação de sobre-endividamento sem poder pagar todos os seus encargos financeiros.
Mas como funciona a insolvência pessoal e como a pode pedir? Preparámos 5 perguntas e respostas para esclarecer as principais dúvidas.
1. O que é a insolvência pessoal e quem pode pedir?
A insolvência pessoal ocorre quando o valor das suas dívidas é superior ao valor total do seu património, rendimentos e bens. Deixa assim de ter capacidade para fazer face a todas as suas responsabilidades financeiras. Por outras palavras, é como se abrisse falência.
Esta solução implica a perda da sua autonomia financeira o que significa ficar limitado na administração dos seus bens durante três anos (período de cessão).
A declaração de insolvência pessoal pode ser pedida pelo devedor, pelos seus credores (a quem deve) ou pelo Ministério Público.
Insolvência conjugal
Se estiver casado em comunhão de bens ou de adquiridos, pode ser pedida a insolvência conjugal. Ficam ambos insolventes, ou seja, os dois membros do casal não têm condições para pagar o que devem. Ainda que um dos elementos tenha contraído dívidas sem o conhecimento do outro, não existindo meios para pagar essas dívidas, o processo de insolvência vai abranger os dois (artigo 264.º, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas - CIRE).
Tome Nota:
Se estiver casado em regime de separação de bens, não é possível pedir a insolvência conjugal. Contudo, cada elemento do casal pode avançar com o pedido de insolvência pessoal.
Ao decidir pedir a insolvência pessoal, tem duas opções:
- A insolvência com a exoneração do passivo restanteem que beneficia do perdão das dívidas que não sejam pagas durante o processo de insolvência;
- A insolvência com apresentação de um plano de pagamentos aos credores, mantendo a obrigação de pagar a dívida. O plano pode incluir, entre outras medidas, o alargamento dos prazos para pagamento, a redução das taxas de juro e o perdão de parte da dívida. Se os credores aceitarem o plano de pagamentos proposto, é considerado aprovado.
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2. Quando e como devo pedir a insolvência pessoal?
Pedir insolvência pessoal é uma decisão difícil, depois de terem sido analisadas todas as opções possíveis e se:
- Concluir que esgotou todas as possibilidades de negociar com os seus credores;
- Não tiver meios financeiros para pagar as dívidas nem bens para vender;
- Se tiver o salário penhorado.
Não pode pedir insolvência pessoal se:
- Teve uma empresa nos três anos anteriores;
- Tem dívidas laborais;
- Tem mais de 20 credores;
- As suas dívidas são superiores a 300 mil euros.
O pedido de insolvência tem de ser apresentado em tribunal, por um advogado mandatado para o efeito. Não tendo recursos para pagar a um advogado, pode pedir apoio judiciário.
Os processos de insolvência são considerados urgentes e, por isso, têm prioridade sobre o serviço normal do tribunal. Durante os períodos de férias judiciais os prazos continuam a correr.
O que mudou na lei
Em abril de 2022, com a entrada em vigor da Lei n.º 9/2022, de 11 de janeiro passaram a vigorar novas regras igualmente aplicáveis à insolvência pessoal. A principal alteração é a redução do período de duração do processo, de cinco para três anos.
3. O que posso fazer se a insolvência for pedida por um dos credores?
Além de pedido por si, por se terem esgotado todas as outras opções, o pedido de insolvência pessoal pode também ser apresentado pelo Ministério Público ou por qualquer um dos credores. Neste caso, se não concordar com o pedido, no prazo de cinco dias, pode ser pedida a suspensão da ação (artigo 40.º do CIRE) ou pode recorrer (artigo 42.º do CIRE).
E quem pode pedir a suspensão da ação?
- O devedor, caso considere que o processo de insolvência foi interposto à revelia, sem ter sido consultado ou citado;
- O cônjuge, os ascendentes, os descendentes e afins, se a declaração de insolvência se basear na fuga do devedor, na sequência da cessação de pagamentos;
- O cônjuge, o herdeiro, o legatário ou o representante do devedor, se este falecer e se o processo de insolvência for interposto à revelia;
- Os credores;
- Os responsáveis legais pelas dívidas da insolvência.
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Procedimento Extrajudicial Pré-Executivo (PEPEX)
O PEPEX permite a qualquer credor (detentor de um título executivo), avaliar se existe alguma possibilidade de recuperar os valores que lhe são devidos ou se são incobráveis. Para as pessoas singulares e coletivas ou equiparadas, o acesso à plataforma é feito exclusivamente por via eletrónica, utilizando as credenciais de acesso ao Portal das Finanças ou com o certificado digital do cartão de cidadão (pessoas singulares). Os advogados e solicitadores devem utilizar o certificado digital emitido pela respetiva ordem profissional.
4. Quais são os efeitos da insolvência pessoal?
Depois de a insolvência pessoal ser declarada pelo tribunal, ocorrem as seguintes diligências:
As penhoras em curso são suspensas
Se existirem processos de penhora ou outro tipo de processos a decorrer contra si, são imediatamente suspensos. A partir dessa data, não podem registar-se pedidos de cobrança coerciva por parte dos seus credores.
Se estiver a decorrer, por exemplo, uma penhora de vencimento, decretada antes de declarada a insolvência pessoal, será imediatamente levantada. Ou seja, fica sem efeito.
Perde todo o património
Durante um período de três anos (o chamado período de cessão), está sujeito a termo de identidade e residência. Tem de apresentar uma morada fixa e mantê-la atualizada.
Os bens e rendimentos são penhorados pelo tribunal e passam a ser geridos por um gestor de insolvência (nomeado pelo tribunal) responsável por vender os bens (geralmente através de leilão online), repartir o valor resultante dessa venda pelos credores e liquidar as dívidas o mais possível.
Penhora de rendas, salários ou outros rendimentos
No caso de penhora de rendimentos, o tribunal notifica o empregador para que o montante penhorado seja descontado do salário do trabalhador, e entregue ao gestor da insolvência.
Qual o valor penhorado do salário?
- O valor abrangido pela penhora só pode ser superior a um terço do vencimento se o devedor receber mais do que três salários mínimos. Se receber menos, o valor penhorado tem de ser inferior a um terço do vencimento;
- Se não tiver mais rendimentos, não pode ser penhorado um valor superior a um salário mínimo nacional (760 euros em 2023), a não ser que exista pensão de alimentos em dívida;
- Para efeitos de penhora, são contabilizados, além do vencimento base, os subsídios de refeição, o pagamento de horas extraordinárias e subsídios de férias e de Natal. É sobre o total destes rendimentos que recai a penhora.
Penhora da casa
Se a casa onde mora for sua, será também vendida e terá de procurar alternativa. Se for arrendatário, pode permanecer no imóvel. O direito de arrendamento é um direito inalienável ou seja, não lhe pode ser retirado.
Penhora do carro
Se existir penhora de carro, os documentos são apreendidos e o carro é imobilizado e selado, ficando à porta de casa do devedor. Só é removido quando for vendido.
Não pode contrair créditos ou fazer investimentos
Durante um período de três anos, não pode contrair novos créditos nem fazer qualquer tipo de investimento sem a autorização do gestor de insolvência.
5. O que acontece após os 3 anos de processo?
Três anos após a declaração de insolvência, o processo é encerrado. Se existirem dívidas ainda por pagar, ficam sem efeito (exoneração do passivo restante). As únicas dívidas não perdoadas e que devem ser completamente liquidadas são:
- Dívidas fiscais;
- À Segurança Social;
- Indemnizações;
- Multas ou coimas e outras sanções por crimes ou contraordenações;
- Dívidas relacionadas com a pensão de alimentos.
A partir deste momento, pode recomeçar a sua vida. Conte porém, com o registo da insolvência no Banco de Portugal. Isto pode dificultar ou impossibilitar a concessão de novos créditos.
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