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As contas ou empresas offshore não têm uma boa reputação. Mas, a verdade é que não é ilegal depositar dinheiro ou sedear uma empresa nos chamados paraísos ficais. A questão é que, muitas vezes, estes mercados são utilizados por pessoas e empresas para ocultar rendimentos com o objetivo de não os declarar no país de residência. E isso, sim, é ilegal.
A designação offshore (longe da costa) ajuda a perceber o conceito. Longe do controlo da administração fiscal nacional e das políticas públicas internacionais, um offshore não está sujeito às mesmas regras que vigoram em Portugal ou noutros países com normas semelhantes.
Particulares e empresas com capitais nesses paraísos fiscais pagam menos impostos (ou não pagam) e beneficiam da reserva que estes territórios lhes proporcionam.
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O que são offshores?
Os offshores são contas ou sociedades em paraísos fiscais. Estes países ou regiões são assim designados porque atribuem benefícios em matéria de impostos para atrair investimento estrangeiro.
Além da carga fiscal mais baixa ou inexistente, outra característica dos paraísos fiscais é a ausência de transparência. Os procedimentos de registo são mais simples, nomeadamente o registo de empresas, mas também as suas obrigações de reporte. Isto faz com que seja possível ali criar uma empresa sem se revelar, de facto, a identidade de quem a detém ou ter a liberdade de movimentar elevadas quantias sem qualquer tipo de controlo.
Estes territórios também não promovem a troca de informações com outros países, pelo que muitos indivíduos e empresas aproveitam esse sigilo para “escapar” ao escrutínio do Fisco ou até mesmo da justiça.
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Para que servem?
Além de permitirem beneficiar de uma tributação bastante reduzida ou inexistente, o que em si não é ilegal, os offshores surgem muitas vezes associados à evasão fiscal e não é por acaso.
Frequentemente, as sociedades offshore e as contas em nome destas empresas servem para ocultar rendimentos que não se tem interesse em declarar no país de residência, evitando assim o pagamento de impostos.
Como não há registos da origem do dinheiro, nem controlo sobre as movimentações financeiras, os paraísos fiscais são também locais propícios a que verbas com proveniência e destino duvidosos possam circular sem que seja necessário dar justificações. Falamos de negócios ilícitos e, inclusive, ligados ao crime organizado.
Ou seja, ter uma conta ou empresa offshore, não sendo ilegal, pode efetivamente, permitir fins menos lícitos; ocultar riqueza; fugir aos impostos ou branquear capitais.
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Qual o impacto na economia e na carteira?
A nível mundial, calcula-se que 10% do valor do PIB de todas as nações esteja localizado em paraísos fiscais, ou seja 5,8 biliões (milhões de milhões) de euros.
Os números constam do livro A Riqueza Oculta das Nações 2014, do professor de economia na Universidade da Califórnia, e atual diretor do Observatório Fiscal da UE, Gabriel Zucman.
Pelas contas do autor, só os portugueses e as empresas nacionais têm, pelo menos, 69 mil milhões de euros em paraísos fiscais, ou seja, mais de quatro vezes o montante que Portugal vai receber do PRR, a famosa bazuca europeia.
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Em todo mundo, 8% do património das famílias e, pelo menos, 40% dos ganhos das empresas multinacionais em cada ano, têm como destino estes territórios, permitindo-lhes escapar ao pagamento de impostos, indica Zucman. E desses montantes, 80% não é declarado ou contabilizado, explica, o que faz com que os offshores custem globalmente 180 mil milhões de euros por ano de receitas fiscais, 71 mil milhões de euros só na Europa.
Se uma entidade offshore não paga impostos no país de residência, esse valor não entra nos cofres do Estado, resultando numa perda de receita que poderia ser aplicada nos serviços públicos daquele país, por exemplo.
Nos países em que estão situados estes paraísos fiscais, porém, o investimento estrangeiro nem sempre implica melhoria de vida das populações. A instalação de empresas pode não corresponder à criação de emprego ou de riqueza.
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Que países são considerados offshores?
O artigo 63.º D da Lei Geral Tributária define o que são considerados países, territórios ou regiões com um regime fiscal claramente mais favorável.
Para esta classificação são tidos em conta quatro critérios:
- Não existir um imposto idêntico ao IRC, ou, se existir, ter uma taxa inferior a 60% da taxa prevista no Código do IRC (21%);
- Regras de determinação de matéria coletável que sejam significativamente diferentes dos padrões internacionalmente aceites ou praticados, nomeadamente pelos países da OCDE;
- Regimes especiais ou de benefícios fiscais (como isenções, deduções ou créditos fiscais) que sejam mais favoráveis do que os que existem na legislação nacional e que resultem numa redução substancial da tributação;
- A legislação ou a prática administrativa não permite o acesso e troca de informações relevantes para efeitos fiscais.
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A lista dos países, territórios e regiões com regimes de tributação privilegiada, claramente mais favoráveis consta de uma portaria que vai sendo periodicamente revista.
As transferências de dinheiro para um offshore são controladas?
As instituições de crédito, sociedades financeiras e demais entidades que prestam serviços de pagamento são obrigadas a entregar a declaração Modelo 38 em que reportam as transferências, individuais ou operações fracionadas, que no seu conjunto excedam 12 500 euros e que tenham como destino os chamados paraísos fiscais.
Caso a operação, ou as várias operações relacionadas entre si, sejam de valor igual ou superior a 15 mil euros, terão também de as reportar ao Banco de Portugal.
De acordo com o Relatório sobre o Combate à Fraude e Evasão fiscais e aduaneiras 2021, as informações disponibilizadas pelo Modelo 38 permitiram que a Inspeção Tributária e Aduaneira tivesse feito, em 2021, 141 inspeções, que levaram a correções e regularizações voluntárias de 19,2 milhões de euros de matéria coletável e 7,2 milhões de euros de imposto.
Tome Nota:
As entidades com sede em offshores podem ser penalizadas na atribuição de apoios públicos. Foi o que aconteceu, por exemplo, com os apoios excecionais criados para ajudar as empresas a superar as dificuldades causadas pela pandemia.
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