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Ser família de acolhimento significa acolher temporariamente crianças ou jovens que, por diferentes motivos, não podem permanecer junto das suas famílias de origem.
De acordo com o relatório Casa 2022 da Segurança Social, em novembro de 2022, 6357 crianças e jovens estavam em instituições de acolhimento e 227 em acolhimento familiar.
A principal situação de risco que levou ao acolhimento ou institucionalização foi a negligência. No entanto, existem também crianças e jovens vítimas de maus-tratos físicos, psicológicos ou de violência sexual.
O que é o acolhimento familiar?
Ser uma família de acolhimento implica oferecer um ambiente seguro e temporário a crianças separadas das famílias. Durante este período, as crianças e jovens devem receber todos os cuidados de que necessitam - sejam físicos, emocionais, de saúde, de educação ou de pertença.
O acolhimento familiar é uma medida de proteção, decidida pelos tribunais ou pelas comissões de proteção de crianças e jovens, que visa a integração em meio familiar, assim como o acesso aos cuidados e educação necessários para o desenvolvimento integral destas crianças e jovens, sem esquecer o carinho e o afeto.
O acolhimento pode ser curto ou de longa duração, sendo que em Portugal o regresso à família de origem é o primeiro objetivo. No entanto, quando não há condições para esse regresso, são decididas outras alternativas definitivas como, por exemplo, a adoção.
Tome Nota:
Os candidatos a família de acolhimento não podem ser candidatos num processo de adoção, assim como as famílias candidatas a adoção não podem candidatar-se ao acolhimento familiar.
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Quais as condições e os requisitos para ser família de acolhimento?
De acordo com o Decreto-Lei n.º 139/2019, que regulamenta o acolhimento familiar, podem ser família de acolhimento:
- Uma pessoa solteira;
- Pessoas que vivem em união de facto ou casadas, sendo que um dos elementos deve ser o responsável pelo acolhimento;
- Dois ou mais familiares que vivam na mesma casa, sendo um dos elementos o responsável pelo acolhimento;
- Não ter qualquer relação de parentesco com a criança ou jovem.
Além destas condições, são também requisitos:
- Ter mais de 25 anos;
- Não ser candidato a adoção;
- Condições de saúde física e mental atestadas por declaração médica;
- Possuir habitação com todas as condições necessárias para o acolhimento;
- Ser uma pessoa idónea;
- Não ter qualquer acusação ou condenação por “crime doloso contra a vida, a integridade física e a liberdade pessoal ou contra a liberdade ou autodeterminação sexual”;
- Não estar impossibilitado de exercer responsabilidades parentais.
Todos estes requisitos também se aplicam às pessoas que coabitam com o responsável pelo acolhimento familiar.
Quantas crianças ou jovens pode acolher uma família de acolhimento?
Uma família de acolhimento, dependendo de algumas condições, pode receber até duas crianças ou jovens. Excecionalmente, a família pode acolher mais. Por exemplo quando há irmãos envolvidos ou ligações de afeto que o justifiquem.
Como candidatar-se a família de acolhimento?
O processo inicia-se com uma manifestação de interesse a uma instituição de enquadramento da área de residência ou nos serviços da Segurança Social.
As instituições de enquadramento são Instituições Particulares de Solidariedade Social (ou equiparadas) que desenvolvem atividade na área da infância e juventude e que têm acordos com a Segurança Social.
Depois de apresentada a manifestação de interesse, é obrigatório participar numa sessão informativa sobre as condições para ser família de acolhimento.
Tome Nota:
Podem ser acolhidas crianças e jovens até aos 18 anos. De acordo com a legislação, é dada prioridade a crianças até aos 6 anos de idade.
A seguir à manifestação de interesse e depois da entrega dos documentos e declarações necessários, é formalizada a candidatura a avaliar através de entrevistas psicossociais, visitas domiciliárias e outros instrumentos de avaliação.
Entre outros requisitos, a instituição verifica se as pessoas que se candidatam a família de acolhimento reúnem as competências necessárias às funções de família de acolhimento, se têm disponibilidade para gerir o dia a dia e estabilidade sociofamiliar. Também analisa a aceitação do processo de acolhimento por parte de todos os elementos da família.
O parecer positivo dá lugar a um certificado de família de acolhimento, emitido pela instituição de enquadramento, e o responsável pelo acolhimento familiar é notificado.
Na página da Segurança Social é disponibilizada uma lista de contactos para mais informações e apresentação de candidaturas.
Objetivos do acolhimento familiar
O acolhimento familiar tem por objetivos garantir às crianças ou jovens:
- Condições adequadas para atender às suas necessidades físicas, mentais, emocionais e sociais;
- Vínculos afetivos seguros e estáveis, fundamentais para a formação e desenvolvimento equilibrado das suas personalidades;
- Competências que promovam sua valorização pessoal, social, académica e profissional;
- Condições que favoreçam a construção das suas identidades e a integração das suas histórias de vida.
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Quais os apoios e benefícios disponíveis?
Os apoios e benefícios disponíveis para aqueles que desejam ser família de acolhimento são vários. Em primeiro lugar, é concedido um subsídio mensal para auxiliar nos custos associados à criança ou jovem. Este subsídio é calculado a 1,2 vezes o valor do Indexante de Apoios Sociais (IAS). Em 2024, este subsídio tem o valor de 611,11€ (1,2 x 509,26€).
Além disso, há um acréscimo de 15% deste valor para cada criança ou jovem acolhido nas seguintes condições:
- Idade até seis anos;
- Presença de deficiência ou doença crónica, devidamente comprovada.
A família de acolhimento também tem direito a:
- Benefícios fiscais, incluindo deduções no IRS;
- Abono de família;
- Direitos laborais, como a possibilidade de faltas para assistência à criança ou jovem e licença parental no caso de acolhimento de crianças até um ano de idade.
É importante destacar que é necessário realizar o pedido destes apoios às entidades competentes.
A necessidade de mais famílias de acolhimento
Apesar de a lei que regulamenta o acolhimento familiar datar de 2019, ainda há poucas famílias de acolhimento em todo o país. De acordo com o Casa 2022, em julho de 2023, havia 278 crianças em 211 famílias, o que faz com que Portugal esteja em último lugar a nível europeu. Há cerca de 6 350 crianças e jovens institucionalizadas, ainda que a opção de acolhimento familiar fique mais barata ao Estado.
Direitos e deveres das famílias de acolhimento
O acolhimento familiar implica uma série de direitos e deveres que devem ser compreendidos pelas famílias que acolhem as crianças ou jovens em situações de vulnerabilidade.
Direitos
A família de acolhimento possui os seguintes direitos:
- Respeito pela privacidade e reserva da sua vida familiar e pessoal;
- Receber formação inicial e contínua;
- Obter toda a informação e documentação necessária sobre a criança a acolher para uma aceitação informada;
- Receber acompanhamento e apoio técnico da instituição de enquadramento;
- Receber apoio financeiro para ajudar nos encargos;
- Requerer os apoios necessários nas áreas de saúde, educação e apoios sociais;
- Participar em grupos de apoio e trabalho entre famílias de acolhimento para partilhar experiências;
- Desfrutar de proteção laboral relacionada com a parentalidade, incluindo direitos como faltas para assistência à criança ou jovem, e licença parental no caso de acolher crianças até 1 ano de idade.
Deveres
A família de acolhimento também tem deveres, tais como:
- Cumprir as responsabilidades decorrentes da confiança da criança, estipuladas no acordo de promoção e proteção ou na decisão judicial;
- Orientar e educar a criança com cuidado e afetividade;
- Facilitar o fortalecimento das relações da criança com a família de origem;
- Garantir acesso a informações atualizadas, sobre o desenvolvimento da criança, à instituição de enquadramento e à família de origem;
- Informar a instituição sobre qualquer alteração nas condições de vida que possa afetar o compromisso do acolhimento;
- Comunicar à instituição alterações de residência e informações sobre períodos e locais de férias;
- Garantir a confidencialidade das informações sobre a situação e os dados pessoais e familiares da criança ou jovem;
- Participar em programas, ações de formação e reuniões promovidas pela instituição;
- Colaborar com a instituição no acompanhamento e avaliação do processo de acolhimento;
- Interdição de acolher continuamente outras crianças ou jovens que não estejam devidamente identificados e abrangidos pelo contrato de acolhimento em vigor;
- Renovar anualmente os documentos que comprovem o estado de saúde e os certificados de registo criminal de todos os membros do agregado familiar e de quem com eles viva;
- Garantir os cuidados de saúde adequados;
- Assegurar que a criança ou jovem frequente um estabelecimento de ensino adequado à sua idade e condições de desenvolvimento;
- Comunicar imediatamente ao gestor de processo qualquer procedimento adotado em relação à criança ou jovem que exija uma intervenção terapêutica urgente e especializada.
Como preparar a chegada da criança ou jovem
Ao preparar-se para receber uma criança ou jovem, a família de acolhimento deve ser criteriosa e considerar a capacidade emocional para acolher a criança real, não a idealizada.
Antes da chegada, é crucial fazer perguntas às equipas responsáveis, abordando diversos aspetos para facilitar a transição da criança para o novo ambiente. Estas perguntas incluem informações sobre a relação da criança com outras pessoas, os seus hábitos alimentares, questões de higiene e vestuário, rotinas diárias, hábitos noturnos, saúde, brinquedos preferidos e adaptação à escola.
Manter as rotinas familiares contribui para uma transição mais suave nos primeiros tempos e a comunicação aberta sobre a criança na escola é fundamental. Ao conhecer estes detalhes, a família vai estar mais bem preparada para oferecer um ambiente seguro e acolhedor.
Neste guia da Adotar e Acolher encontra informação mais detalhada sobre como preparar a chegada a uma nova criança ou jovem à sua nova família de acolhimento.
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A informação deste artigo não constitui qualquer recomendação, nem dispensa a consulta necessária de entidades oficiais e legais.